Massificação do samba urbano
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No começo da
década de 1970, novamente o samba viveria um período de revalorização, que projetaria
cantoras como
Alcione,
Beth Carvalho e
Clara Nunes - ambas com grandes vendagens de discos -,
[24] além do
cantor Roberto Ribeiro e dos
compositores João Nogueira,
Nei Lopes e
Wilson Moreira. O samba passou a ser novamente muito executado nas rádios, com grande destaque para sua vertente
partido-alto e com o domínio das paradas de sucesso por artistas como
Martinho da Vila,
Bezerra da Silva, Clara Nunes e Beth Carvalho.
Na virada da
década de 1960 para a
década de 1970, o jovem
Martinho da Vila daria uma nova face aos tradicionais
sambas-enredo consagrados por autores como
Silas de Oliveira e
Mano Décio da Viola, compactando-os e ampliando sua potencialidade no mercado musical. Além disso, Martinho popularizaria o estilo do
samba-de-partido-alto (com canções como
"Casa de Bamba" e
"Pequeno Burguês"), lançadas no seu primeiro álbum em
1969.
Embora o termo tenha surgido no início do
século XX nas rodas na casa da
Tia Ciata - inicialmente para designar música instrumental -, o termo
partido alto
passou a ser utilizado para denominar um tipo de samba que é
caracterizado por uma batida de pandeiro altamente percussiva, com uso
da palma da mão no centro do instrumento para estalos. A harmonia do
partido alto é sempre em tom maior, geralmente tocado por um conjunto de
instrumentos de percussão (normalmente
surdo,
pandeiro e
tamborim) e acompanhado por um
cavaquinho e/ou por um
violão. Mas este partido-alto assimilado pela
indústria fonográfica era feito de solos escritos, e não mais improvisados e espontâneos, segundo os cânones tradicionais.
[13]
Também naquela década, muitos críticos musicais cunharam em sentido pejorativo os termos
samba-jóia ou
sambão-jóia,
para designar um tipo de samba supostamente de qualidade duvidosa ou
cafona. Outros críticos perceberam no termo - e nos cantores e
compositores a ele relacionado - uma certa importância para a
MPB. Entre alguns nomes do samba-jóia, estavam
Agepê (interprete de
"Moro onde não mora ninguém"),
Antonio Carlos e Jocafi (de
"Você abusou"),
Benito Di Paula (de
"Retalhos de cetim" e às vezes também classificado como "
sambolero com um toque latino", pois usava freqüentemente em suas apresentações
piano,
timba,
chimbal),Pandeiro,Tumbadora,Baixo e Timbales
Luiz Ayrão (de
"Mulher à brasileira"),
Jorginho do Império (de
"Dinheiro vai, dinheiro vem"),
Os Originais do Samba (de
"Falador Passa Mal"),
Tom e Dito (de
"Tamanco malandrinho").
Beth Carvalho também emplacaria
"Vou Festejar" e
"Coisinha do Pai",
dois sambas chamados "jóias logo aceitos por várias faixas sociais -
principalmente pelas mais baixas -, mas considerados por alguns críticos
como de
"qualidade duvidosa".
[24]
Outros críticos, no entanto, valorizavam o fato deste estilo de samba
recolocá-lo nas principais emissoras de rádio e TV do país, além de
serem responsáveis por vendas expressivas de discos do gênero naquela
década.
[1] Parte da crítica favorável via em
"Tonga da Mironga do Kabuletê" (de
Toquinho e
Vinícius de Moraes) como exemplos de samba-jóia.
Ainda na década, se destacaria na
cidade de São Paulo Geraldo Filme, um dos principais nomes do samba paulistano - ao lado de
Germano Mathias,
Osvaldinho da Cuíca,
Tobias da Vai-Vai,
Aldo Bueno e
Adoniran Barbosa,
este último já devidamente reconhecido nacionalmente antes de ser
relembrado e regravado com mais frequência nos anos setenta. Sambista da
Barra Funda, um reduto do samba
paulistano, Firme era também freqüentador das rodas de
"Tiririca", no Largo da Banana, e montou os espetáculos
"Balbina de Yansã" e
"Pagodeiros da Paulicéia", em parceria com
Plínio Marcos.
Em
Salvador, compositores como
Riachão, Panela,
Batatinha, Garrafão e Goiabinha, foram seguidos por
Tião Motorista,
Chocolate, Nélson Balalô, J. Luna,
Edil Pacheco,
Ederaldo Gentil,
Walmir Lima,
Roque Ferreira,
Walter Queiroz,
Paulinho Boca de Cantor e
Nelson Rufino, que mantiveram a tradição dos
sambas-de-roda e
samba-coco.
E ao final da década,
João Bosco em dupla com o
poeta Aldir Blanc - dois discípulos dos estilos de
violão tocados por Baden Powell,
Dorival Caymmi e
Gilberto Gil
- também ajudariam a renovar o samba tradicional (inclusive o de
enredo) - algo que Aldir continuaria a fazer com novos parceiros como
Guinga e
Moacyr Luz na
década de 1990.
[1]
Depois de um período de esquecimento onde as rádios eram dominadas pela
Disco Music e pelo
rock brasileiro, o samba consolidou sua posição no mercado fonográfico na
década de 1980. Compositores urbanos da nova geração ousaram novas combinações, como o paulista
Itamar Assumpção, que incorporou a batida do samba ao
funk e ao
reggae
em seu trabalho de cunho experimental. Mas foi no início da década de
1980 que o samba reapareceu no cenário brasileiro com um novo movimento,
chamado de
pagode. Com características do
choro
e um andamento de fácil execução para os dançarinos, o pagode é
basicamente dividido em duas tendências. A primeira delas é mais ligada
ao
partido-alto,
também chamada de pagode de raiz, que conservava a linhagem sonora e
fortemente influenciada por gerações passadas. A segunda tendência,
considerada mais
"popular", ficou conhecida como
"pagode-romântico" e passou a ter grande apelo comercial na
década de 1990 em diante.
Nascido no final da
década anterior,
por meio das rodas de samba que um grupo de cantores e compositores
faziam embaixo da tamarineira da quadra do Bloco Carnavalesco
Cacique de Ramos, o pagode era um samba renovado, que utilizava novos instrumentos que davam uma sonoridade peculiar àquele grupo, como o
banjo com braço de cavaquinho (criado por
Almir Guineto) e o
tantã (criado por
Sereno), e uma linguagem mais popular.
Pontuado pelo banjo e pelo tantã, o pagode seria uma resposta ao
ocaso do samba no início dos anos oitenta, que teria obrigado os seus
seguidores a se reunirem em fundos de quintal para mostrar suas novas
composições diante de uma platéia de vizinhos. Este ramal do samba,
movido a partido-alto, revelaria inicialmente nomes como Almir Guineto,
Jorge Aragão,
Jovelina Pérola Negra e
Zeca Pagodinho (o único que se firmaria ao fim da onda inicial) - além do
Grupo Fundo de Quintal, que revelaria ainda a dupla
Arlindo Cruz e
Sombrinha. Também partideiro, da década anterior,
Bezerra da Silva emplacaria seus chamados
"sambandidos", canções com enredos que documentavam a guerra civil da sociedade partida.
[2]
Em meio da euforia consumista do
Plano Cruzado,
os pagodeiros se mostraram excelentes vendedores de discos - sempre
mais de 100 mil cópias por lançamento - e conquistaram seu espaço na
grande mídia, de onde não saíram mais do rádio e da TV. Esse pagode,
cujo auge mercadológico verificou-se exatamente em
1986, teve como mola mestra estética a ampla exposição e revalorização do
partido-alto, modalidade de samba, até então de pouquíssima visibilidade. Assim, as rodas de samba de
"fundos de quintal" revelaram ou confirmaram o talento de muitos bons versadores, cultores da velha arte, como a dupla que reunia o conhecido
Zeca Pagodinho e o desconhecido Deni de Lima, sobrinho de Osório Lima, legendário compositor do
Império Serrano.
[13]
De uma curtição exclusivamente suburbana, os pagodes (tanto a festa,
com suas comidas e bebidas, quanto o novo estilo) se tornaram moda
também nos bairros da
zona sul do Rio
e em diversos localidades do Brasil. O ímpeto aos poucos diminuiu, com a
consequente queda de poder aquisitivo do seu maior público consumidor –
as classes menos abastadas. Mas logo, uma nova modalidade desse
subgênero, bem mais comercial e desvinculada das raízes, passaria a ser
conhecida como pagode.
[25]